domingo, 12 de maio de 2013

Princípio da causalidade

«A admissão ou a rejeição do princípio da causalidade, na vida real como na diegese romanesca, dependem fundamentalmente de uma visão do mundo, isto é, de uma ideologia. Esta problemática é assim analisada pelo narrador de Nítido nulo, romance de Vergílio Ferreira: «O princípio de causalidade. Não existe. Para pessoas não existe. Porque uma causa só é causa quando a gente quer que o seja. Se não quer que o seja, não é causa de nada. E é por isso que um juiz arreia num criminoso. Mas curiosamente, quando o advogado de defesa fala em «atenuantes», já acredita na causalidade. E o juiz também, que o ouve - um outro barco avança na linha do horizonte. Vem no mesmo sentido do primeiro, vão ambos para o norte, que é que haverá para o norte? Mas sem o princípio da causalidade não saberia contar nada. Há coisas que acontecem antes e outras que aconteceram depois; e o simples facto de contar uma antes e dizer que outras aconteceram depois faz entender que as que aconteceram depois vêm na força de sequência das que aconteceram antes. Como se aquilo que aconteceu, pelo facto de ter acontecido, tivesse de acontecer. E não tem. Mas para o sabermos teríamos de voltar atrás, o que não é possível» (Nítido nulo, Lisboa, Portugália Editora, 1971, p. 25).

Vítor Manuel de Aguiar e Silva, Teoria da Literatura

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